Daniel Faria

As múltiplas leituras, que a verdadeira arte suscita, descobrem, com surpresa, na obra do poeta de Baltar, filões inovadores. Estudos atentos verificam aproximações de Eugénio de Andrade, de Herberto Helder, de Ruy Belo, Luísa Neto Jorge, Carlos Drumond de Andrade entre outros, mas rendem-se à diferença sedutora do tópico religioso.
A opção pela vida monástica, cedo considerada como hipótese, analisada durante a estada nos Seminários do Porto, onde vários padres lhe colocaram nas mãos a obra de grandes poetas, implica e define o mundo interior que irradia na sua escrita criativa e rigorosa. Após se licenciar em Teologia, com a tese sobre Frei Agostinho da Cruz, que tive o gosto de orientar, Daniel frequentou a Faculdade de Letras – Porto, estabelecendo contactos frequentes com Singeverga e residindo, no último ano (1997-1998), em S. Bento da Vitória.
A procura de "um quadrado de sossego / para a distância absoluta" levou-o a entrar no Noviciado beneditino em 1998. Um acidente, uma queda desamparada para trás, levá-lo-ia ao hospital de S. João onde acabaria por entrar em coma e, após operação sem sucesso, percorrer o último degrau. Era o dia 9 de Junho de 1999. Tinha 28 anos e cinco livros publicados: três de juventude e dois de maturidade. Ultimava ‘Dos líquidos’ para 2000.
Os muitos amigos, cultivados com delicadeza por este cavador do silêncio, guardam testemunhos das suas expressões de arte. O essencial está reunido nos livros: Poesia, já em terceira edição da Quasi, embora com gralhas que já convinha corrigir, e Livro do Joaquim.
A Associação Casa Daniel (www.casadaniel.pt.to/) está a erguer perto do Mosteiro de S. Pedro das Águias – Tabuaço, um ermitério, um lugar de sossego espiritual para ser "uma mão cheia de água que queima / o cansaço, […] uma mão / cheia de fogo que apaga / o cansaço" (Poesia, 380). À maneira do Daniel cada pessoa é chamada a descobrir dentro de si e livre de si o voo dos pássaros.
D. Carlos Azevedo, Bispo auxiliar de Lisboa