"Só o Homem pergunta e pensa… nesse seu perguntar, pode surgir a questão da transcendência e de Deus" O Cristo Pensador

"Karl Rahner, talvez o maior teólogo católico do século XX — tenho a honra de ter sido seu aluno —, deixou escapar um dia, numa aula, uma daquelas observações que nunca mais se esquecem"
"Na Igreja católica é obrigatório confessar os pecados graves e mortais, mas não estava a ver que algum bispo ou padre ou superior religioso, ministro ou professor católico se tenha confessado do pecado grave e, frequentemente, mortal, da ignorância culpada, da incompetência fatal, da inteligência irresponsavelmente menorizada"
"Na Igreja, valoriza-se a obediência, referindo constantemente aquele passo de São Paulo: “Cristo obedeceu até à morte e morte de cruz”. Mas quase nunca se explica o que é essa obediência de Cristo, ocultando que, para obedecer a Deus e ao que Deus quer — dignidade, futuro, fraternidade, liberdade —, teve de desobedecer aos opressores, nomeadamente a uma religião que, em vez de libertar, oprimia"
Neste quadro, torna-se cada vez mais acentuada a constatação de Hans Küng, um dos últimos maiores teólogos, tão maltratado pela Igreja oficial: "O estudo da teologia católica é hoje escassamente atractivo para mentes livres e criativas"
"Na Igreja, valoriza-se a obediência, referindo constantemente aquele passo de São Paulo: “Cristo obedeceu até à morte e morte de cruz”. Mas quase nunca se explica o que é essa obediência de Cristo, ocultando que, para obedecer a Deus e ao que Deus quer — dignidade, futuro, fraternidade, liberdade —, teve de desobedecer aos opressores, nomeadamente a uma religião que, em vez de libertar, oprimia"
Neste quadro, torna-se cada vez mais acentuada a constatação de Hans Küng, um dos últimos maiores teólogos, tão maltratado pela Igreja oficial: "O estudo da teologia católica é hoje escassamente atractivo para mentes livres e criativas"
Karl Rahner, talvez o maior teólogo católico do século XX — tenho a honra de ter sido seu aluno —, deixou escapar um dia, numa aula, uma daquelas observações que nunca mais se esquecem: na Igreja católica é obrigatório confessar os pecados graves e mortais, mas não estava a ver que algum bispo ou padre ou superior religioso, ministro ou professor católico se tenha confessado do pecado grave e, frequentemente, mortal, da ignorância culpada, da incompetência fatal, da inteligência irresponsavelmente menorizada.
Em geral, nas igrejas, faz-se muito pouco apelo à razão, à reflexão crítica, à pergunta. Como se a fé não tivesse de conviver com a inteligência, com a dúvida e com a pergunta. Os cristãos — mas isso acontece em todas as religiões — parece que ficam tolhidos na sua capacidade de perguntar. No entanto, Jesus morreu a rezar esta pergunta infinita que atravessa os séculos: “Meu Deus, meu Deus, porque me abandonaste?” e, perto de nós, Martin Heidegger, um dos filósofos mais influentes do século XX, escreveu que “a pergunta é a piedade do pensamento”.
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Na Igreja, valoriza-se a obediência, referindo constantemente aquele passo de São Paulo: “Cristo obedeceu até à morte e morte de cruz”. Mas quase nunca se explica o que é essa obediência de Cristo, ocultando que, para obedecer a Deus e ao que Deus quer — dignidade, futuro, fraternidade, liberdade —, teve de desobedecer aos opressores, nomeadamente a uma religião que, em vez de libertar, oprimia.
Tanto entre os crentes como entre os ateus e os sem religião, não faltam os que sabem, com saber certo, sem qualquer dúvida nem hesitação, o que Deus é, em que consiste a vontade divina para cada pessoa, qual é o sentido da história e do mundo. Entronizados no poder, definem dogmas, estabelecem normas e mandam com soberania inquestionável.
Perguntar vem do latim percontari, que, por sua vez, terá na sua base contus, vara comprida. Então, perguntar, etimologicamente, quer dizer examinar o fundo de um rio ou de um tanque com um bastão e, por extensão, sondar o interior do homem e da realidade.
Só o Homem pergunta e pensa. Um animal com a mão encostada à face ou a face entre as mãos, a cabeça inclinada e absorto, é um ser humano que pensa: tenta ver o seu interior e o mais fundo de tudo. Nenhum outro animal pensa nem se examina nem examina as consequências dos seus actos nem pergunta. O Homem pergunta, e a sua pergunta não tem limites. E é assim que, nesse seu perguntar, pode surgir a questão da transcendência e de Deus. Como escreveu Theodor Adorno, da Escola Crítica de Frankfurt, “o pensamento que se não decapita desemboca na transcendência”.
Por tudo isto, é uma surpresa boa encontrar em Vilnius algo típico da Lituânia, talvez porque é um povo que sofreu demasiado: umas pequenas estátuas de Cristo a pensar — o Cristo Pensador. Trouxe uma que me acompanha.
Pensar vem do latim pensare, com o significado de ponderar, examinar, pesar argumentos e razões. Pensar pode ter também o significado de aplicar o curativo, os remédios necessários — aí está o penso para curativo. E é assim que, em português, pesar também quer dizer solidariedade com a tristeza de alguém que sofre.
Neste quadro, os incontáveis horrores que nos rodeiam obrigam a pensar. Mas, por outro lado, também por influência dos smartphones, o QI está a cair. E, no que à Teologia se refere, torna-se cada vez mais acentuada a constatação de Hans Küng, um dos últimos maiores teólogos, tão maltratado pela Igreja oficial — partiu a 6 de Abril de 2021: “O estudo da teologia católica é hoje escassamente atractivo para mentes livres e criativas.”
